Série - Pedaço de mim e a paternidade não responsável dos progenitores
- Rachel Serodio
- 19 de ago. de 2024
- 2 min de leitura

No universo da ficção, a série Pedaço de Mim nos traz uma realidade que, infelizmente, reflete com precisão o que muitos enfrentam fora das telas. A trama é dura, mas é um espelho fiel da nossa sociedade, contemplando narrativas socialmente normalizadas.
Logo nos primeiros capítulos vemos a protagonista, Liana (Juliana Paes) com o foco em engravidar, desejo esse do casal mas que com o tempo fez com que Tomás (Vladimir Brichta) perdesse o interesse pelo relacionamento, que ao invés de estabelecer junto a companheira prioridades, sai de casa para viajar e pedalar com a amante.
No desenrolar da trama, Liana é vítima de um boa noite cinderela, aplicado pelo já conhecido e irmão de sua melhor amiga, Oscar (Felipe Abib). Após a viol€nci@ sofrida, a protagonista, demora a compreender tudo o que vivenciou naquela noite, descobre a gravidez de gêmeos e vivenciado uma superfecundação heteroparental ( gravidez de gêmeos de pais diferentes).
A partir daí, podemos observar nesta data comercial, diversos marcadores de abandono parental. O paradoxo constitucional do princípio da paternidade responsável, que tentou em vão exigir conduta parental na letra fria da lei.
Tomás aceita assumir os 2 filhos para não saberem socialmente que sua mulher espera um filho também de outro mas trata ambos com flagrante diferença.
Oscar, quando toma conhecimento de que é pai de Marcos usa a paternidade para chantagear Liana, mas deixa claro (gargalhando) que não quer ser pai, apenas $$ para não contar a verdade aos meninos.
Os transtornos decorrentes da disfuncionalidade paterna de Tomás são coletivos e intergeracionais. Ficção somente? Jamais. A série aglutina em ato as evidências de que a maternidade é compulsória e a paternidade uma escolha. Reflexo de um Brasil que ainda legitima sem políticas públicas efetivas e de um sistema de justiça androcentrado a permissão de que a paternidade seja opcional. Não a toa somos quase 6 milhões de crianças com assento de nascimento em branco sem falar daqueles que registram mas não a exercem, como Tomás, que depois de anos sem ver os filhos escolhe ser pai (no papel) de Matheus e ensaia uma discussão em audiência para reivindicar a guarda e maior convivência com o filho, com o intuito claro de atingir Liana, que resolveu seguir sua vida.
Ser pai é uma construção social precária de Brasil. Há de se reinventar no capitalismo a sua existência e função.
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